O contador de histórias do nosso cérebro.

De onde nasce a memória? Segundo pesquisadores, cabe ao hipocampo conectar eventos distantes e separados em uma única narrativa.

Como jornalista, aprendi a contar histórias muito antes de o storytelling virar modinha no marketing e na comunicação. Quando me dizem: “queremos fazer um storytelling”, eu sempre respondo: “Certo, mas que história você quer contar?”. Sem uma boa e verdadeira história não existe storytelling. Entendo a popularização do tema: todos adoramos histórias porque elas nos envolvem, emocionam, ajudam a lembrar de eventos que, de outra forma, seriam esquecidos. Agora, parece haver uma explicação científica para isso. O nosso cérebro tem um contador de histórias particular: cabe ao hipocampo conectar eventos distantes e separá-los em uma única narrativa.

O estudo sobre o processo de formação da memória foi feito pelo Center for Neuroscience da University of California, em Davis, e publicado no finalzinho de setembro. Os pesquisadores descobriram que o hipocampo parece juntar peças ao longo do tempo para transformá-las em narrativas conectadas. É como se ele montasse um lego.

Diferentemente dos filmes e novelas, as coisas que acontecem na vida real nem sempre se conectam diretamente, mas podemos nos lembrar melhor dos detalhes de cada evento se eles formarem uma narrativa coerente. A pesquisa pode levar a melhores testes clínicos para os estágios iniciais de declínio da memória provocado pelo envelhecimento ou por demências – Alzheimer entre elas.

Para chegar a essa conclusão, os voluntários ouviram gravações de contos. No dia seguinte, eles foram examinados enquanto relembravam as histórias. Como esperado, foi detectada maior facilidade para aprender uma história coerente do que uma que não se conectava. “Os resultados mostram as memórias coerentes sendo tecidas juntas”, disse Brendan Cohn-Sheehy, um dos autores do estudo, professor no Center for Neuroscience da UC Davis, no artigo ”Hippocampus is the brain’s storyteller”, publicado pela revista EurekAlert!. De alguma forma, quando relembramos histórias que formaram uma narrativa coerente, o hipocampo ativa mais informações, lembramos mais.

Outra pesquisa fresquinha sobre memória descobriu que lembramos das coisas por mais tempo se fizermos pausas durante o aprendizado. O tal ‘efeito de espaçamento’, possivelmente, permite que as conexões neuronais se fortaleçam a cada evento de aprendizagem, de forma que o conhecimento fique armazenado por mais tempo. Sabe o estudante que, um dia antes do vestibular, tenta enfiar uma grande quantidade de informação no cérebro? Tempo jogado fora.

Se estiverem corretos, os neurobiologistas Annet Glas e Pieter Goltstein, ligados ao The Max Planck Society, organização de pesquisa alemã, confirmaram que a receita de descansar na véspera da prova é mais benéfica do que tentar relembrar tudo no desespero. Se a lição já foi estudada, o hipocampo já fez seu trabalho de montar uma narrativa que faz sentido. Portanto, na hora da prova, a memória vai funcionar.

Maria Tereza Gomes é jornalista, mestre em administração de empresas pela FEA-USP, CEO da Jabuticaba Conteúdo e mediadora do podcast “Mulheres de 50” – Matéria originalmente publicada em Época Negócios.

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